25 de set. de 2013
A moça grande do Rio...
Ela não era gorda. Ou talvez fosse. Não, pensando bem, não era. Tinha um corpo antigo, isso sim. Um corpo de vedete de teatro rebolado. Um corpo fora de moda, uma mulher grande. Não alta; grande. Taluda. Podia posar para um quadro daquele pintor colombiano, Fernando Botero. Estava parada em frente a um espelho de parede, no corredor dos banheiros de um restaurante libanês do Leme, zona sul do Rio.
Da minha mesa, podia vê-la muito bem, e vi que estava concentrada na imagem refletida no espelho. O resto do mundo, Obama, Síria, julgamento do Supremo, o resto do mundo não existia. O que existia era ela e sua imagem. Mirava-se de frente e de lado e de novo de frente e mais uma vez de lado. Examinava-se com critério. Examinei-a também. As panturrilhas dela…Vou dizer: as panturrilhas dela eram do tamanho de melões. Braços de lutador de MMA. Quadris da circunferência de um botijão de gás. Ela era toda possante e vestia uma saia justa e uma blusa justa e se alçava aos píncaros de um sapato de uns dez centímetros de altura. Era morena clara, de cabelos nigérrimos e pele alvíssima. Seria de origem libanesa? É possível.
Essa mulher, essa quase gorda, ela se olhava com gosto.
Era perceptível que aprovava o que via. Alisou a saia com as mãos, esticou a blusa, aproximou o rosto do espelho e conferiu alguma imperfeição na maquiagem dos cílios. Depois, recuou um passo e continuou a se admirar.
Virou-se outra vez de perfil, analisou a silhueta e, antes de voltar para a mesa, fez algo que me surpreendeu e me encantou: sorriu. Sorrindo, ela caminhou até as pessoas que almoçavam com ela, e sorrindo sentou-se, desdobrando o guardanapo com graça.
Não era, decerto que não, o tipo de mulher que a maioria das pessoas considera bonita. Eu mesmo, confesso, não a definiria como protótipo de beleza feminina. Para os padrões atuais seria tachada de gorda. Não obesa, mas sem dúvida acima do peso. Só que ali estava uma mulher satisfeita consigo mesma. Uma mulher vaidosa. A forma como se olhou, como se empertigou diante do próprio reflexo e, sobretudo, a forma como sorriu ao se perscrutar, mostrou que ela sentia orgulho do seu corpo.
E então pensei: como sou tacanho, eu e meus limites estéticos. Que espírito catequizado, esse meu. A raça humana é tão vasta,tão cheia de belezas inesperadas, e a minha mente é tão restrita, tão arrabaldina. Olhei de novo para a moça sentada ali adiante, rindo com os amigos. Ela sorria com a confiança da mulher bonita e, mesmo que continuasse não a achando bonita, compreendi que a beleza, na verdade, não está na pessoa que olha, mas na pessoa que sabe ser bela.
(David Coimbra)
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